segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Análise: Eleição é mais que uma novela de enredo ruim

Análise: Eleição é mais que uma novela de enredo ruim


Talvez banalizada por tantas eleições, talvez desvitalizada pelo pouco carisma dos candidatos, a campanha segue sem graça. Eleições já não empolgam como antes, quando a ditadura e os inimigos eram claros. Ninguém se veste de orgulho cívico, nem acredita que “o povo unido jamais será vencido”; nada é tão crucial e decisivo, nem tão romântico. À exceção dos militantes agora pagos, quem se aventuraria nas bocas de urna? Melhor que seja assim; a ausência de paixão é também cristalização de certo amadurecimento.

Mas, a política não morreu. Ela é inevitável, pois ainda é o instrumento para a negociação de conflitos, construção de consensos, definição de vencedores e consolo dos vencidos. De outro modo, teríamos a guerra, que, ademais, é a política por outros meios. Diria o velho Marx que mesmo sem saber a história que fazem, os homens fazem a história. E seu instrumento é a Política. Então, qual é a questão Política desta eleição?

A questão é dar vazão ao desenvolvimento. E nesse sentido, como assinalou o candidato do PSOL, Dilma, Serra e Marina pouco se diferem. Na verdade, estão na perspectiva da gestão do capitalismo. O que Plínio não reconhece é que as alternativas são mais que escassas que a retórica, e seu radicalismo assenta-se antes na impunidade de quem não disputa para valer ou de quem já atingiu mesmo a idade da impunidade, o veterano respeitado cujo discurso e tempo passaram.

Todavia, entre os três candidatos há sim questões políticas relevantes e elas podem ser entendidas identificando os grupos e interesses que representam. É um começo para entender a eleição como algo mais que uma novela de enredo ruim.

Assim, menos que uma liderança, Dilma Rousseff é a representante de um projeto de poder continuado, assentado na imagem de Lula e escorado na construção de um amplo bloco de forças econômicas e sociais: os fundos de pensão, donos do capitalismo brasileiro; os grandes conglomerados formados com a ajuda do BNDES; as duas centrais sindicais; os maiores partidos do país (PT e PMDB) e uma miríade de movimentos mais ou menos cooptados pelo governo. Além da popularidade de Lula, é claro.

José Serra, que se eleito em 2002 teria erguido edifício semelhante, vocaliza anseios e reclamos da classe média urbana, cujo setor mais ruidoso, mais ou menos decadente e apenas pretensamente informado e esclarecido, empunha cartilhas antes de tudo moralistas. Não que inexistam motivos para reclamar, mas em grande medida o dínamo da rejeição a Lula que acalentam é mais estético que moral. Maluf, Collor e que tais foram mais facilmente assimilados.

Serra não é só isso, mas o PSDB, desde a candidatura sensaborona de Geraldo Alckmin, vem se conformando em ser uma espécie de UDN, ironicamente hegemonizado pelo discurso do DEM.

Já Marina anseia por ser “o novo”, mas não consegue. Setores médios que se desgarraram do PT e do PSDB a adotaram como alternativa. Afinal, expressa a defesa de uma causa tão politicamente correta quanto nobre e necessária, a Ecologia. Mas sua fragilidade não seduz ao grande eleitorado, sua doçura não enfeitiça; sua poesia não encanta. Explicar o tal “desenvolvimento sustentável” não é mesmo tarefa simples. No mais, haja charme pessoal para romper os muros construídos por petistas e tucanos.

A realidade é mais complexa e apenas algumas linhas não esgotam o assunto. O negócio é acompanhar e buscar essências, contradições; a possibilidade (ou não) de superação. Compreender para não se perder. Situar candidaturas e qualificar seus enredos. Isto talvez torne esta eleição menos burocrática. E a política menos sem graça. Descobrir o conflito é achar o encanto das coisas.

*Carlos Melo é Cientista Político, Doutor pela PUC-SP, professor de Sociologia e Política do Insper. Autor de “Collor, a ator e suas circunstâncias”.
http://twixar.com/ewani
Carlos Miranda Lima Filho reporter DRt 1422

Comentários:

Criação e Manutenção por ::By Tony Miranda [71] 9978 5050::
| 2009 |